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A análise e o confrontamento dos dois principais meios de mobilidade adotados pelo país e a passagem por seus diferentes ciclos, demonstra que a ferrovia fora fator importante ao desenvolvimento da economia cafeeira e o consequente surto do desenvolvimento industrial. Já as rodovias surgem num momento de busca em torno da integração nacional e desejo de modernização das bases econômicas do país, reflexos do intenso processo de industrialização vivido.

 

A expressão Patrimônio da Mobilidade decorre do fato de que o crescimento da economia brasileira não foi acompanhado do processo de modernização de suas antigas bases de mobilidade urbana, reflexo da busca crescente da agilidade e velocidade nos modais de comunicação ocorridos em um período em que o Estado intervinha fortemente na economia.

 

Em síntese, estas ações intervencionistas prejudicam a continuidade do modal ferroviário de transportes, incentivando seu processo de deterioração e degradação em meio à paisagem urbana consolidada. A criação e o fortalecimento de órgãos administrativos juntamente ao desenvolvimento de políticas de estímulo às vias rodoviárias, somados aos grandes investimentos privados, aceleram a substituição do modelo anterior. Deste momento em diante as rodovias, diferentemente das ferrovias, passam a ser considerado um fator importante para o PROGRESSO do país.

 

Sendo a ferrovia precursora de uma “indústria moderna”, gera como consequência uma série de transformações em seu entorno, desta forma, a metodologia desta pesquisa optou pelo estudo e levantamento histórico-geográfico em torno do avanço ferroviário e a consequente dispersão industrial da porção Oeste de São Paulo, cujas características não se encontram isoladas ao eixo de determinada companhia, mas sim estruturadas por um conjunto de cidades organizadas como uma rede, unidas entre si pelo eixo linear representado por sua companhia, ou por demais conexões situadas de forma perpendicular ao eixo principal (sendo representadas por estradas ou outras companhias ferroviárias que passam a atuar na mesma área de influência que o eixo pioneiro). Características capazes de estruturar conceitos em torno da mobilidade e descrever suas formas de atuação em meio à transformação da paisagem natural.

 

A partir de uma análise multidisciplinar a pesquisa possibilita a leitura histórico-geográfica estruturada em torno das companhias ferroviárias do Oeste do Estado de São Paulo e suas respectivas cidades de influência.

 

Em seu primeiro movimento a pesquisa demonstra que com o avanço da “Frente Pioneira” [1] a ferrovia se transforma no elemento propulsor ao processo de urbanização e desenvolvimento econômico do Oeste do Estado de São Paulo. Já em meio ao seu segundo movimento a pesquisa busca a construção narrativa do processo de configuração, reconfiguração e transformação das “zonas pioneiras” [2] do Oeste Paulista, vistos agora como elementos do Patrimônio da Mobilidade um ambiente onde a Arqueologia e Patrimônio Industrial agem em suporte ao conhecimento histórico, ambiental e urbano de sua região.

 

Ao atingir o Estado de São Paulo no século XIX, a cultura do café torna-se a responsável pela dispersão espacial e consequente desenvolvimento econômico de inúmeras regiões do Estado. Com o passar dos anos, as novas fronteiras previstas pela “Marcha para o Oeste” [3] representam tanto a expansão das novas fronteiras agrícolas, quanto novas estratégias em busca da integração nacional.

 

O Oeste paulista foi o motor de vários fenômenos impressionantes e rápidos: o surgimento de uma nova aristocracia rural, que passaria a dominar também a cena política da província e investir na crescente industrialização da capital, (...) a província de São Paulo, que até o começo dos anos de 1880 não se destacava no cenário nacional, se transformaria no Estado mais populoso e desenvolvido e sua capital na maior cidade do país e uma das maiores do planeta. (LANGENBUCH. In: RETTO Jr. et. al., 2011)

 

Neste contexto, a associação existente entre progresso e ferrovias se caracteriza como um discurso amplamente utilizado ao longo do século XIX, buscando estimular os novos investimentos neste setor em todo o mundo. Castro (1993) afirma que o progresso alcançado com os trens ultrapassaria o aspecto material, pois as estradas de ferro exerceriam influencias positivas sobre o conjunto das atividades humanas, como os costumes, a moral, a cultura, a instrução e a política. A mesma autora ainda afirma que “o engenheiro apareceria substituindo o bandeirante, como o desbravador de áreas desconhecidas e aquele que permitia a ocupação e incorporação destes lugares ao corpo da nação,” os ideais modernos impostos pelo vapor alteravam dia a dia o cotidiano do “sertão”, uma vez que” (...) o que uma indústria ferroviária produz, para vender no mercado, é o transporte.” (AZEVEDO, 1950:282)

 

 

[1] Frente Pioneira: esta expressão é utilizada por autores como Pierre Monbeig para a identificação da cidade, ou ponto limite do avanço dos trilhos de determinada companhia. Este processo é comandado pela Franja Pioneira, que em seu processo de desbravamento do território paulista iniciado a partir do Estado do Rio de Janeiro, mais pecisamente do Vale do Paraíba.

 

[2]Neste artigo é por muitas vezes empregada a expressão ‘Oeste Paulista’, expressão que corresponde a regionalização geomorfológica adotada por Almeida (1974) ao caracterizar a região do Planalto Ocidental Paulista. Neste ambiente, a expressão "áreas pioneiras", corresponde ao termo adotado por Monbeig (1984) para caracterizar as áreas que primeiro foram abertas pelas ferrovias.

 

[3]A expressão Marcha para o Oeste se refere ao processo de expansão do território brasileiro intensificao a partir do século XIX. O intuito era promover a ocupação do território além dos limites da Depressão Periférica Paulista. Tal empreitada permitiria a interligação de diversos Estados brasileiros ao porto de Santos. Esta marcha demonstra a consolidação do Estado de São Paulo em relação aos demais Estados nacionais. Compõe tal Marcha os Estados de São Paulo, Paraná, Mato Grosso e Minas Gerais.

Referências Bibliográficas:

AZEVEDO, Fernando de. Um trem corre para o oeste: Estudo sobre a Noroeste e seu papel no sistema de viação nacional. São Paulo: Martins Editora S.A, 1950.

 

CASTRO, Maria Ines Malta. O preço do progresso: a construção da estrada de ferro Noroeste do Brasil (1905-1924). Tese de Dissertação de (Mestrado), Unicamp, Campinas, 1993.

 

LANGENBUCH, J. R. Ferrovias e cidades do Oeste Paulista. In: RETTO Jr., Adalberto da Silva; ENOKIBARA, Marta; CONSTANTINO, Norma Regina Truppel; MAGALHÃES, Kelly Cristina. Conhecimento histórico – ambiental integrado na planificação territorial e urbana. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.

PATRIMÔNIO DA MOBILIDADE
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